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Witzel na mira da PF

Governador é incluído em investigação de desvio de dinheiro e superfaturamento

Wilson Witzel, governador do Rio
Wilson Witzel, governador do Rio -

A Operação Placebo, deflagrada ontem pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério Público Federal (MPF), colocou o governador Wilson Witzel e a primeira-dama, Helena Witzel (PSC), no centro de uma investigação sobre desvio de dinheiro público na compra de equipamentos hospitalares. Viaturas da PF chegaram cedo ao Palácio Laranjeiras para cumprir mandados de busca e apreensão. Witzel disse estar sendo perseguido pelo presidente Jair Bolsonaro.

O MPF apura fraudes no contrato de R$ 835 milhões entre o governo do estado e a Organização Social (OS) Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas), responsável pela construção de hospitais de campanha. Segundo o MPF, a OS fraudou documentos e superfaturou preços de insumos.

A Operação Placebo cumpriu mandados de busca e apreensão em 12 endereços ligados ao governo do Rio e ao Iabas, em São Paulo e no Rio. Agentes estiveram nas residências do ex-secretário de saúde do estado, Edmar Santos, e do ex-subsecretário de saúde Gabriel Neves, preso no início de maio por suspeita de fraude na compra de respiradores sem licitação.

A Operação Placebo é continuação da Favorito, que investiga a participação do empresário Mário Peixoto em esquemas de fraude e superfaturamento na Saúde do Rio. A Procuradoria Geral da República (PGR) encaminhou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) as investigações. Segundo o ministro Benedito Gonçalves, "o MPF imputa indícios de participação ativa do governador do Estado quanto ao conhecimento e ao comando das contratações realizadas com as empresas ora investigadas".

 

Deputada pode ter vazado informações

Wilson Witzel e a primeira-dama, Helena Witzel, foram alvos da Operação Placebo um dia após a deputada federal Carla Zambelli (PSL) revelar à Rádio Gaúcha, do Rio Grande do Sul, que a Polícia Federal faria operações contra governadores e prefeitos corruptos. A parlamentar, que é ligada ao presidente Bolsonaro, pode ser alvo de investigação por abuso de poder por parte do Ministério Público Federal (MPF).
A representação foi feita pelo deputado federal Alessandro Molon (PSB), para que o órgão apure se houve vazamento de informação sobre a Operação Placebo, já que a parlamentar disse em entrevista na segunda-feira que a Polícia Federal iria agir nos próximos meses contra alguns governadores.

Durante entrevista à Rádio Gaúcha, ela pareceu ter conhecimento das ações da PF e que ocorreria o “Covidão”. “A gente já teve algumas operações da Polícia Federal que estavam para sair, mas não saíam. E a gente deve ter nos próximos meses o que a gente vai chamar, talvez, de “Covidão” ou de não sei qual vai ser o nome que eles vão dar. Mas já tem alguns governadores sendo investigados pela Polícia Federal”, declarou.

À CNN ontem, Zambelli se defendeu das acusações. "Eu não sou uma pessoa burra. Se eu tivesse informação privilegiada, eu falaria isso publicamente? Se há algum tipo de interferência (de Bolsonaro na operação de hoje), o presidente também está agindo em cima do STJ?", indagou. Ainda segundo ela, a deflagração da ação menos de 24 horas após suas declarações, foi “uma feliz coincidência”, que ela espera que se repita em outros estados.

Aliada ao presidente Jair Bolsonaro, a parlamentar teve trocas de mensagens com o então ministro Sérgio Moro divulgadas por ele, no último mês. No conteúdo, ela tentou convencer Moro a permanecer no cargo, apesar da troca do ex-diretor-geral da Polícia Federal, Mauricio Valeixo. Ela chegou a indicar a possibilidade do ministro ocupar um cargo no Supremo Tribunal Federal (STF). Por conta disso, ela precisou ser ouvida no STF.

Ela também participou da articulação para remanejar a atriz Regina Duarte da Secretaria Especial da Cultura para a cinemateca, como forma de “saída honrosa” da pasta e para que ela não ficasse desassistida após o rompimento do contrato com a TV Globo. Zambelli também se reuniu com o ator Mário Frias para que ele ocupasse o cargo antes de Regina.
Para o jurista Wallace Martins, especialista em direito criminal, a conduta de controle à Polícia Federal é uma prática ilegal. "Parece que o presidente Bolsonaro tem, de fato, o controle sobre a Polícia Federal, o que é absolutamente ilegal. A Polícia Federal é instituição de estado. Não pertence ao presidente, nem a sua família. Causa muita estranheza o fato de a investigação ser deflagrada logo agora. Witzel é grande rival político do presidente. Eu entendo que o governador deva requerer investigação sobre o fato, sobretudo por Carla Zambelli ter anunciado ontem a operação, exatamente no dia anterior". 

Governo gasta R$ 1 Bi em contratos

O Governo do estado gastou R$ 1 bilhão em contratos emergenciais sem licitação para o combate à pandemia da covid-19. Desse valor, R$ 836 milhões foram destinados à OS Iabas, responsável pelos sete hospitais de campanha, dos quais mais de R$ 200 milhões já foram pagos, para a administração de 1,4 mil leitos das unidades.

Até o momento, somente a unidade do Maracanã está em funcionamento. Os demais hospitais tiveram as datas de abertura prorrogadas quatro vezes, e o atual secretário de saúde, Fernando Ferry, chegou a cogitar a não entrega das unidades. Mas o governador Wilson Witzel afirmou, em uma rede social, que todas serão entregues.

O novo cronograma de inaugurações, agora, vai até o próximo dia 18. A expectativa era que todos os hospitais estivessem funcionando desde 30 de abril. Contra a OS, há uma proibição de participar de novas licitações no município do Rio, durante dois anos, pelo descumprimento de contratos e erros administrativos nas UPAs de Costa Barros e Madureira.

No último dia 17, o então secretário de saúde Edmar Santos foi exonerado, após denúncias de fraudes na compra de respiradores. Ela já havia sido alvo da Operação Mercador, que investigou a encomenda de respiradores com preços acima da média do mercado. Foram disponibilizados R$ 138 milhões para a compra e R$ 33 milhões já haviam sido pagos por mil respiradores. Apenas 52 equipamentos foram entregues e não servem para o tratamento do novo coronavírus.

A ação do Ministério Público e da Polícia Federal resultou nas prisões dos ex-subsecretários de saúde Gabriell Neves e Gustavo Borges da Silva. Apesar de deixar o cargo, Santos continua na comissão de notáveis que auxiliam o governo no enfrentamento à pandemia. Além deles, foram presos Aurino de Souza Batista Filho, integrante da empresa de informática A2A, que ganhou contrato para fornecer respiradores ao estado, e Cinthya Silva Neumann, sócia da empresa Arc Fontoura Indústria e Comércio e Representações Ltda, que venceu o primeiro processo administrativo de contratação, com R$ 169,8 mil por respirador, somando valor correspondente a R$ 67.920.000.

Na semana passada, outros dez integrantes de um grupo criminoso foram presos. Em um grampo feito com autorização judicial, o empresário Luiz Roberto Martins, apontado como operador financeiro do empresário Mário Peixoto, comentou com o ex-diretor da OS IDR, Elcy dos Santos, que alguém do estado queria registrar na nota fiscal o valor de R$ 250 mil por cada respirador, quando estes custariam R$ 32 mil.

Mário Peixoto, preso no dia 14 de maio, é apontado como verdadeiro responsável pela empresa Atrio Rio, que mantém nove contratos com o governo do estado. Somente este ano, o grupo recebeu R$129 milhões. Segundo o MPRJ, a empresa mudou de nome e dono no último mês, em uma possível tentativa de acobertar o verdadeiro dono da empresa.

Bolsonaro elogia operação da PF

O presidente Jair Bolsonaro parabenizou a Polícia Federal pela operação realizada, ontem, em endereços ligados ao governo do Rio. Na saída do Palácio da Alvorada, o chefe do Estado disse que ficou sabendo da ação através da imprensa.

"Parabéns para a Polícia Federal", respondeu Bolsonaro, com um sorriso no rosto, quando questionado por um apoiador sobre a operação. A Operação Placebo foi realizada pela Polícia Federal de Brasília.

Anteontem o governo federal havia oficializado a nomeação do delegado Tácio Muzzi como novo superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro. A escolha por Muzzi foi do novo diretor-geral, Rolando de Souza.
O presidente já havia declarado que o superintendente da Polícia Federal no Rio será o considerado por ele como o número dois da PF.