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Trabalho redobrado

Funcionários do ramo funerário precisam de sensibilidade para amparar familiares

Jorge Lino (esquerda) e Bruno Barcellos, agentes funerários no Caju
Jorge Lino (esquerda) e Bruno Barcellos, agentes funerários no Caju -

Tranquilidade sem parecer frio, acolhimento sem extrapolar na emoção. A pandemia do coronavírus multiplicou a jornada de trabalho dos agentes funerários, já que a escalada de óbitos só aumenta no Brasil. Quem atua no ramo precisa de sensibilidade para amparar a família na dor da perda e jogo de cintura para tratar de valores em um momento tão difícil. Os dias têm sido duros. 

"Nem quando estou de folga consigo desligar. Às vezes sonho com as famílias e acordo de madrugada", confessa Jorge Lino, há três meses agente funerário da concessionária Reviver no Cemitério São Francisco Xavier, no Caju. "A morte não é se, é quando. Mas nunca estamos preparados para isso. Às vezes, você se envolve. O sentimento de perda pode se manifestar no familiar como angústia, raiva. Existem mortes trágicas, lidar com isso é complicado".

Para Bruno Barcellos, também agente funerário no Cemitério do Caju, o trabalho triplicou nas últimas semanas por conta do coronavírus. Familiares chegam dos hospitais de hora em hora e o desafio emocional também aumentou: é preciso fazer a família entender que o enterro de óbitos suspeitos de Covid-19 é feito com o caixão lacrado, sem velório, com limite de tempo e de participantes. "O atendimento tem aumentado bastante. A rotina tem sido puxada, agora estamos lidando com mais falecimentos que aconteceram de repente, em poucos dias, o que abala mais a família", conta. 

Sensibilidade à flor da pele

O agente funerário é ilustrado na cultura popular como uma figura fria, que ganha a vida a partir da dor alheia. O desafio, porém, é o oposto: é preciso reconfortar a família e controlar as emoções para não desmoronar com ela.
"A gente lida com a venda do serviço, mas também temos sentimentos. Temos que amenizar os da família e os nossos. Isso é o mais importante: tratar como humano, mesmo, como se fosse da família da gente. A família fica conversando com a gente durante um tmepo, desabafando. Isso é importante para o processo. Não é só escolher valores de urnas ou ornamentação", conta Bruno Barcellos.
Para Jorge Lino, a emoção está ainda mais à flor da pele nas últimas semanas. "Agora durante a pandemia tem sido ainda mais sensível. Você convive com a pesoa dez, quinze, vinte, quarentena anos e não pode dar um último adeus. Você não pode abrir o caixão, mal colocar uma coroa de flores. Não tem cerimônia. Eu me ponho no lugar delas. Muitas vezes que tem pessoas aqui que a gente tem que se segurar para não chorar".